P&D - Aperfeiçoamento da Estrutura das Tarifas de Energia Elétrica no Brasil

O objetivo principal deste projeto é reduzir para toda a sociedade os custos de expansão da rede de distribuição, alocando corretamente os recursos escassos, maximizando a eficiência alocativa, sem esforços inúteis e gastos desnecessários e, ainda, sem prejuízo às distribuidoras.

Apesar de a metodologia atual de cálculo dos custos de uso da rede de distribuição estar bem- conceituada do ponto de vista horário e por nível de tensão, os objetivos básicos da tarifação do Uso da Rede não estão sendo completamente alcançados no Brasil.

A rigidez da estrutura tarifária atual e a impossibilidade de aplicação de sinal horário regional têm impedido a efetiva otimização do uso da rede e, pior que isso, em vários casos, têm induzido o consumidor a reduzir a demanda em horários e períodos do ano que não são de carga máxima da rede de distribuição, o que acarreta desperdício de esforços e recursos por parte do consumidor, sem a contrapartida de economia de investimento em expansão, ou seja, gerando prejuízo para a sociedade.

Uma mudança no modelo tarifário deve vir se, e somente se, colocar a sociedade em uma situação melhor que a anterior.

O cálculo dos Custos de Uso da Rede sem diferenciação em Rede Urbana, Rural e Subterrânea tem levado sobrepreços aos clientes de Média Tensão, e impedido a necessária transparência dos custos e dos subsídios cruzados. Um novo passo rumo ao cálculo do custo locacional precisava ser dado e, para isso, este projeto de P&D desenvolveu uma nova metodologia que leva em consideração não só a participação do cliente na demanda máxima das redes, como também o ponto de sua conexão.

A forma atual de construção da TUSD, com o mercado realizado sem ajustes, com aplicação de novas modalidades de forma opcional, ou com correção das modalidades existentes, via de regra, impõe prejuízo às distribuidoras, impedindo, assim, a evolução das tarifas de uso da rede.

As distribuidoras no Brasil não têm incentivos para investir em eficiência energética e impulsionar o uso otimizado da rede, pois isso significa perda de mercado e receita entre Revisões, de forma que é preciso eliminar o antagonismo entre eficiência energética e otimização da rede versus recuperação dos custos das distribuidoras.

Além disso, as distribuidoras estão sofrendo perdas de receita em situações de queda de mercado, incentivando-as a optar por preços fixos, desprezando o sinal econômico para o uso racional da rede. Por fim, as consultas e audiências públicas que trataram de tarifas para baixa tensão exigiram um posicionamento da ESCHER e o aprofundamento dos custos de uso da rede e da passagem desses custos às tarifas para dicutir com o setor elétrico.

Os Custos de Uso da Rede

Os custos do Fio estão associados à potência máxima das redes, que é a variável explicativa do seu desenvolvimento. Ou seja, o planejamento da expansão tem como dado de entrada a projeção da demanda máxima das redes e subestações. Logo os custos de expansão da rede são calculados em R$/kW, como também são calculados em R$/kW os Custos de Uso da Rede ou Custo de Capacidade, que é o custo atribuído a cada cliente.

Todo o raciocínio do uso da rede deve partir do fato que a rede de distribuição não é disponibilizada para apenas 1 (um) consumidor, mas para milhões de consumidores, e uma análise correta de Custo de Uso da Rede passa necessariamente pela consideração da participação de cada cliente na composição da demanda máxima das redes, variável responsável pela expansão do sistema de distribuição. Logo é essa participação na demanda máxima das redes que deve ser atribuída a cada cliente, denominada por vários autores internacionais de Coincident Peak, como também de Peak Contribution, ou, mais precisamente, contribution to system coincidente peak demand.

Porém os Custos de Uso da Rede são calculados com a demanda máxima do cliente, que não necessariamente coincide com a hora de carga máxima das redes, sendo este o fator principal a ser considerado no seu cálculo, que é a relação entre a demanda máxima do cliente e a demanda que ele efetivamente contribui na formação da demanda máxima das redes, denominada na metodologia atual de Fator de Coincidência.

Um transformador atende, em média, 40 consumidores, e um alimentador, 5 mil consumidores. Esse uso compartilhado, com grande diversidade das demandas, é um fator fundamental nos custos de desenvolvimento do sistema, sendo que a participação de cada cliente na demanda máxima da rede é diferente conforme sua classe e porte de consumo.

Em média, quanto maior o Fator de Carga – FC do cliente, menor é a diferença entre sua demanda máxima e a sua demanda na hora de carga máxima das redes e vice-versa. Isso pode ser comprovado em qualquer amostra de medições de curva de carga de clientes.

Essa propriedade leva à seguinte situação: em média, os custos dos clientes de maior FC, em R$/kW, atendidos em um mesmo nível de rede, são maiores que os custos dos clientes de menor FC. E, em segunda instância, em média, clientes de maior porte, atendidos em um mesmo nível de rede, custam mais que os clientes de menor porte, pois existe uma correlação estreita entre porte do consumidor e FC, e entre FC e Fator de Coincidência. Deve-se esclarecer que, em qualquer faixa de consumo da BT, existem clientes com maior e menor fator de carga, porém quanto menor o consumo, maior a presença de clientes com fatores de carga mais baixos.

Custos de Uso do Sistema de Distribuição

A constatação de que o custo do cliente depende de sua contribuição à demanda máxima das redes, e que esta ocorre em horários distintos, foi apresentada por Houthakker (1951):

Para ver como essas circunstâncias afetam a política tarifária, é útil separar os custos de eletricidade em quatro categorias de acordo com sua relação com a produção, ou mais precisamente, de acordo com seu comportamento em relação a uma pequena mudança em algum aspecto da produção. Custos de Energia, que se alteram com a quantidade de kWh gerada, todo o mais permanecendo igual. São principalmente despesas com combustível e perda [...]. Custos de Capacidade , que dependem da demanda máxima antecipada (em kW) no equipamento [...]. É importante notar que o momento de demanda máxima não é o mesmo em todos os lugares. Por causa da rede de interconexão, todas as plantas de geração na Grã-Bretanha têm uma ponta simultânea, mas um transformador que atende uma área residencial, por exemplo, pode muito bem ter um horário de ponta diferente, o mesmo se aplica às linhas de transmissão. Custos de Consumidor , que são função do número e tipo de consumidores. Estes incluem os custos de medidores, faturamento etc; conexões utilizadas por um único consumidor (um item importante nas áreas rurais) e Custos Residuais , que não se enquadram em nenhuma das categorias anteriores. [...`] não devem ser assumidos como proporcionais a uma determinada quantidade, compreendem despesas de administração etc.

Houthakker, nesse mesmo documento, também aborda, já em 1951, os conceitos sobre o custo de uso da rede:

A tarifa de demanda máxima é o sistema usual para grandes e médios clientes industriais. Cada uma das três principais classes de custos é considerada separadamente. A tarifa volumétrica é baseada inteiramente nos custos de energia; [...]. Os custos por consumidor são incluídos numa tarifa fixa, que varia com a demanda máxima registrada durante um período acordado, refletindo assim os custos de capacidade. Há vantagens evidentes nas relações claras entre os custos e o faturamento alcançadas dessa forma. O alto custo de medidores confiáveis de demanda máxima, no entanto, torna essa tarifa inadequada para pequenos consumidores. Mesmo quando aplicável, não é uma solução ideal, já que a capacidade requerida por um consumidor individual não depende de sua demanda máxima, mas da sua contribuição à demanda coletiva nos equipamentos de geração e transmissão.

Sobre a inadequação da tarifação do uso da rede pela demanda máxima (não coincidente), pode-se buscar Garfield & Lovejoy, em Public Utility Economics (1964), Passey, Haghdadi, MacGill, & Bruce (2017), dentre muitos outros. Jim Lazar, em Use Great Caution in Design of Residential Demand Charges (2016), coloca o seguinte:

Hoje, com dados de medidores inteligentes, os reguladores de serviços públicos podem dedicar-se à forma como os custos são recuperados, concentrando-se na boa definição dos períodos de pico e fora de pico do mês, e não apenas uma única hora de uso. Esses dados de uso mais precisos fazem com que a tarifação de demanda seja uma abordagem bastante antiquada para todas as classes de clientes – e particularmente inadequada para consumidores residenciais.

E ainda:

"O desenho de tarifas modernas precisa distinguir as diferentes características no uso da capacidade e garantir que todos os consumidores façam uma contribuição adequada nos custos de capacidade do sistema. Tudo isso reflete o movimento gradual em direção à recuperação equitativa dos custos de capacidade do sistema, mas a tarifação por tempo de uso em energia é mais eficaz, mais aderente aos custos, mais equitativa e mais compreensível.

Na matéria de Hledik, R., & Lazar, J. Distribution system pricing with distributed energy resources, (2016), consta o seguinte trecho, com título “DEMAND CHARGES: AN OBSOLETE CONCEPT”:

"Citando os padrões NARUC adotados na década de 1950, Garfield e Lovejoy disseram, há meio século, que os custos de capacidade devem ser atribuídos a cada hora do ano, de modo que todos os clientes contribuam para o custo de capacidade, concentrando essas cobranças nos períodos de alta carga. O preço horário, incorporando os custos de capacidade em algum nível no preço da energia em cada hora, é muito mais granular e preciso na recuperação desses custos do que os preços por demanda mensal.”

Ainda sobre o impacto que cada tipo de cliente provoca nos custos de expansão da rede, acrescenta-se as seguintes considerações:

  • Um cliente de 138 kV de 100 MW de demanda faturada praticamente exige 100 MW de capacidade na rede de 138 kV, pois é um cliente de longa utilização, e sua demanda máxima é próxima da sua contribuição à demanda máxima do sistema: Dmax  CP.
  • Para ocupar essa mesma capacidade de 100 MW na rede, são necessários 80 mil clientes residenciais com consumo inferior a 220 kWh com demanda de 5 kW. Porém a soma das demandas máximas desses clientes é 400 MW, ou seja, 4 (quatro) vezes maior que a demanda máxima da rede, o que significa dizer que a demanda máxima faturável é bem superior à demanda coincidente na rede. Assim cada kW adicional de demanda máxima do cliente BT de baixo consumo custa ¼ do custo da demanda máxima dos clientes de 138 kV (pelo uso da rede de 138 kV).

Não há dúvida que os custos de uso da rede, em média, são menores para os clientes de menor porte, e semelhantes em R$/MWh, e que as tarifas mais aderentes aos custos dos clientes de baixa tensão são em R$/MWh, diferenciadas em postos tarifários. Este P&D demonstrou isto de forma simples e indubitável.

Decoupling

O problema de garantir a receita não é resolvido apenas com as regras tarifárias, a solução deve ser buscada também nas regras de nível tarifário, ou seja, na receita a ser utilizada no processo de construção das tarifas entre revisões.

Por exemplo, a tarifa da transmissão é nodal, cobrada dos consumidores e geradores, muito variável com entrada de novos usuários e relativamente complexa, porém as transmissoras não correm risco de mercado, porque o modelo não é Price Cap, mas Revenue Cap.

Porém na distribuição não é possível aplicar Revenue Cap da mesma forma que na transmissão, pois não se trata de uma linha de alta tensão a ser licitada pelo regulador, mas de inúmeros elementos da rede que estão crescendo em número e ampliando em capacidade e extensão constantemente.

Assim, para resolver essa questão, devem-se buscar soluções além da construção das tarifas, pois nenhuma modalidade garante totalmente o equilíbrio econômico entre revisões. A tarifa que minimiza os riscos é, com certeza, aquela mais aderente aos custos, mas, mesmo assim, não evita perdas entre revisões como a redução efetiva de mercado, tanto de energia quanto de demanda.

Um método amplamente discutido, que visa solucionar esse problema, é o Decoupling. Nesse mecanismo, usado principalmente nos Estados Unidos, o nível tarifário é dissociado (desvinculado) de variáveis de mercado (kW ou kWh medidos). A grande diferença com o sistema atual é que, nos reajustes, o VPB a ser utilizado no cálculo da TUSD Fio B não é igual à receita Fio B realizada ou dependente do mercado realizado, mas calculado com outra variável, como, por exemplo, o número de consumidores.

É importante frisar que não se trata de aplicar um preço fixo pelo uso da rede. O consumidor continua pagando as diversas modalidades de tarifa (em R$/kW, R$/MWh, diferenciada em postos tarifários), no entanto, a receita base para cálculo das tarifas de uso da rede evolui com o número de consumidores. Esse é exatamente o fundamento do mecanismo todo: a receita não é ajustada por variáveis que estão postas para os clientes como metas de eficiência.

As tarifas são construídas na Revisão com todo um regramento, estabelecido no Proret, para reconhecimento da Base de Remuneração e Custos Operacionais. A base de ativos, por exemplo, é aquela contabilizada até seis meses antes da revisão, auditada e avaliada pelo Valor Novo de Reposição, e ainda com regras para Índice de Aproveitamento.

Assim definida a receita autorizada, com o mercado dos 12 meses anteriores à Revisão, são construídas as Tarifas de Uso do Sistema de Distribuição, que deveriam cobrir os custos da empresa até a revisão subsequente.

Nos cinco anos seguintes a empresa faz um Plano de Investimentos compatível com a expectativa de crescimento de mercado. Porém, se a distribuidora projetar mal o seu mercado, investir muito, e este mercado crescer menos que suas expectativas, ou crescer menos nos subgrupos de maior custo e receita, esta incorrerá em prejuízos. Isso é um risco atribuível à distribuidora, associado à sua capacidade de planejamento, que nesse exemplo não soube projetar seu mercado, não soube gerenciar seus custos de investimento.

Por outro lado, se no ano seguinte à revisão o mercado reduzir por conta da economia volátil do país, da redução das exportações, da falta de água para irrigação, ou até por conta do emblemático acidente da Samarco, as tarifas precisam necessariamente ser reposicionadas, pois:

  • Redução de consumo/demanda não é uma situação comum. O normal é o consumo/demanda crescer, mais ou menos, mas crescer.
  • Quando o consumo reduz, notadamente a distribuidora não tem como desativar os ativos, retirar postes, reduzir a potência dos trafos.
  • Da mesma forma, não se reduz pessoal porque o mercado reduziu.
  • Muito menos se reduz os custos de leitura, faturamento, arrecadação, cobrança, ou seja, os custos comerciais. O comportamento desse custo é muito claro: continua a crescer sempre, e sem cobertura em situação de redução de consumo.

Assim, como primeira condição, a receita Fio da distribuidora nunca pode ser menor que a Receita Requerida Fio (VPB), definida no momento da Revisão. Outra situação seria no ano tarifário seguinte à revisão o mercado crescer bastante, a empresa investir, construir linhas, colocar capacidade nos trafos, aumentar seus custos bem como a sua receita para fazer frente aos investimentos e, no terceiro período tarifário, o mercado reduzir.

Obviamente a receita da distribuidora do terceiro período tarifário também não pode ser inferior à receita do segundo período, pois a empresa investiu, e não há como fazer desativação da rede, além disso, o número de clientes cresceu e continuará crescendo e, portanto, também os custos comerciais.

Assim o VPB0 de cada reajuste tarifário deve, no mínimo, ser o maior valor entre a Receita Fio faturada no período de referência e a Receita Fio faturada no período de referência do Reajuste anterior, se este processo tiver sido Reajuste, ou o VPB definido na Receita Requerida, se o processo tarifário anterior tiver sido uma Revisão. Ou seja, é preciso definir uma Revenue Floor.

Isso resolveria quase plenamente a perda de receita da distribuidora em situações de queda de mercado, sem necessidade de criar modalidades tarifárias sem aderência aos custos, que também trazem riscos às distribuidoras e prejuízo à sociedade. Mas tem o inconveniente de não cobrir os custos de expansão pois, mesmo em queda de mercado, a distribuidora investe para atender novos usuários, o número de clientes sempre cresce, novas redes são lançadas para atender novas habitações, novos bairros etc. Assim, em situações de queda de mercado, o VPB a ser utilizado no cálculo da TUSD Fio B deve evoluir com o número de consumidores, dissociando-se da receita realizada.

Assim a proposta deste P&D para preservação da saúde econômico-financeira da distribuidora, para incentivá-la a promover programas de eficiência no uso da energia, para estimulá-la na aplicação de tarifas fio com sinalização econômica, aderentes aos custos dos diversos e distintos consumidores, trazendo a eficientização também para a rede, é a seguinte:

TUSD Fio B em R$/MWh e Decoupling parcial

Este método calcula o VPB de cada processo tarifário parcialmente desacoplado do VPB realizado e a TUSD aplicada é definida em R$/MWh.

O VPB de cada reajuste é definido pelo maior valor dentre:

  1. VPB definido na revisão e atualizado pelo crescimento do número de consumidores

  2. Deixa-se claro que, se houver queda de mercado, ainda assim haverá perda de receita no ano tarifário em andamento, porém as tarifas serão recompostas no processo de reajuste subsequente. Para evitar a perda de receita em queda de mercado, que não é uma situação comum, seria necessária a aplicação de um Preço Fixo aos usuários de rede, precaução esta que não compensa todos os prejuízos desse tipo de tarifação: perda de receita e não cobertura dos custos de expansão, quando houver crescimento do consumo per capita, eliminação da sinalização econômica, com o fim do incentivo ao uso racional da rede e da redução dos custos de expansão, não aderência aos custos dos diversos e distintos usuários, com inserção de subsídio cruzado, cobrando mais dos clientes de menor porte.

  3. VPB Realizado do período de referência do processo de reajuste em andamento

  4. Se houver crescimento de mercado, poderão ocorrer duas situações:

    1. crescimento de mercado com aumento do consumo per capita
    2. crescimento de mercado com redução de consumo per capita

    Quando houver crescimento do consumo per capita, significa que o consumo cresceu mais que o número de consumidores, ou seja, que houve aumento dos consumidores de maior consumo. Significa que a empresa teve de investir mais em capacidade de rede, logo, o custo de expansão é maior que o custo médio, de forma que a receita realizada, com aplicação de TUSD em R$/MWh, acompanhará melhor os custos de expansão que o VPB crescendo com o número de consumidores. Conclusão: o correto nesse caso é que o VPB utilizado no processo de reajuste subsequente para o cálculo das tarifas fio seja o VPB realizado no período de referência.

    Quando houver diminuição do consumo per capita, significa que o número de consumidores cresceu mais que o consumo, que os clientes de menor porte cresceram mais que os clientes de maior porte, e/ou que os clientes existentes reduziram seu consumo, incentivados por programas de eficientização, por exemplo.

    Nessa situação, a receita realizada com a TUSD em R$/MWh, também acompanha melhor os custos de expansão da rede de distribuição, pois exigirá uma expansão menor de capacidade que a média. No entanto, cabe aqui uma reflexão para o regulador: se não for permitido que, nessa condição, o VPB do processo tarifário também cresça com o número de consumidores, haverá um desincentivo para as distribuidoras encaparem programas de eficiência e aplicarem tarifas com sinalização econômica, que provocam redução de mercado, cujos resultados, extremamente positivos, serão repassados aos consumidores na revisão subsequente. Daí a necessidade de se desacoplar também o VPB de base para o cálculo das tarifas fio quando houver redução do consumo per capita. Deixa-se claro, que, ainda assim, haverá perda de receita no ano tarifário em andamento, porém com redução de custos, o que estimularia as distribuidoras a investirem em eficientização.

Assim a proposta deste projeto de P&D de definir o VPB de cada reajuste pelo maior valor dentre:

  1. VPB definido na revisão e atualizado pelo crescimento do número de consumidores.
  2. VPB Realizado do período de referência do processo de reajuste em andamento.

É o mais benéfico para a sociedade, pois, além de garantir o equilíbrio econômico das distribuidoras definindo um revenue floor em queda de mercado, garante uma receita para cobertura dos custos das novas ligações, acompanha os custos na situação de crescimento do consumo per capita e elimina as barreiras para que as distribuidoras promovam programas de eficiência energética e se envolvam na aplicação das tarifas com sinalização econômica, buscando a otimização do uso da rede, ações que irão reduzir os custos do setor elétrico.

Conclusões do projeto

Pelas análises detalhadamente apresentadas por este P&D, fruto da pesquisa conceitual nacional e internacional, da análise do comportamento dos clientes e das redes de diversas distribuidoras, das inúmeras simulações, cálculos e discussões entre os pesquisadores do projeto, isso somente irá ocorrer com a evolução das Tarifas Time of Use, que precisam ter sinal regional e maior liberdade de definição dos postos tarifários.

Não é adequado ao Brasil a aplicação de tarifas em R$/kW, nem Preço Fixo, para cobrar pelo uso da rede de baixa tensão. Essa maior liberdade, ou flexibilidade, abrange a possibilidade de:

  • Definir um número de postos tarifários diferente de dois (AT) ou três (BT).
  • Estabelecer o número de horas para cada posto tarifário mais adequado às características da rede de cada distribuidora.
  • Definir pela necessidade de considerar, ou não, os sábados e domingos/feriados em cada posto tarifário.
  • Aplicar sinal econômico diferente conforme o mês ou período sazonal e nenhum sinal nos meses de carga baixa, ou seja, preços iguais nesses meses.
  • Definir postos tarifários e sinais de preços diferenciados, conforme característica de carga de cada regional, dentre outros.

O sinal regional é fundamental na otimização da rede, pois todas as empresas têm regiões com horário de carregamento e comportamento de carga totalmente distinto, regiões inclusive sem necessidade de modulação da demanda.

Está-se falando inicialmente apenas do “sinal horizontal”, que depende somente de estudo mais detalhado do comportamento da rede, facilmente mapeado hoje com apoio do BDGD, e não necessariamente de nível tarifário.

Este é o segundo passo: conhecer os Custos Locacionais Horários de Uso da Rede. Mesmo que não se aplique aos consumidores finais tarifas de uso maiores ou menores conforme seu ponto de conexão na rede, mantendo apenas a diferença locacional entre subgrupos tarifários (“estrutura vertical”), a metodologia desenvolvida no âmbito deste P&D irá resolver uma série de simplificações e imperfeições do modelo atual. Mesmo que se construam as tarifas diferenciadas em nível apenas entre os subgrupos tarifários, a partir da média dos custos locacionais horários de uso das redes envolvidas no atendimento de cada subgrupo, o resultado será mais preciso.

Uma das simplificações é que a tipologia da rede de 138 kV, por exemplo, é obtida a partir das medições de fronteira com a rede básica e das medições de geradores que injetam diretamente nessa rede, porém, as linhas mudam de comportamento ao longo de sua extensão, à medida que clientes de 138 kV são atendidos, ou quando se apresenta uma subestação A2/A3 ou A2/MT, de forma que as medições de fronteira caracterizam apenas a curva de carga do trecho da linha na saída da SE. O mesmo acontece, por exemplo, quando se utiliza as medições das subestações A2/MT para definir o comportamento da carga dos alimentadores, que também se altera significativamente do tronco para os ramais, com agravante de a medição da transformação representar a soma de vários alimentadores.

Além disso, a metodologia atual não enxerga fluxo reverso, não calcula os custos de uso da rede impostos pelos geradores, não calcula os Custos de Uso da Rede diferenciados em Urbano e Rural e ainda distorce a estrutura vertical. As redes rurais de média tensão são criadas para atender predominantemente os clientes rurais, que no caso da ELFSM estão concentrados na baixa tensão. O fluxo total da rede de média tensão é a soma da demanda dos clientes MT e BT. Quando se calcula um custo médio da rede MT, ponderado pelo fluxo total da rede rural (maior parte BT) e pelo fluxo total da rede urbana, e com esse custo médio de rede calcula-se o Custo de Uso devido pelos clientes MT, pode-se chegar a um custo elevado, sobrecarregando as tarifas dos clientes MT Urbanos, como na ELFSM. O contrário também pode acontecer, aumentando as tarifas dos clientes BT, se o mercado rural da empresa for concentrado na média tensão.

Todas essas simplificações e deficiências do atual modelo, dentre outras, serão resolvidas com a metodologia do custo locacional horário, usando o OPEN DSS, no qual o comportamento da carga de cada trecho da rede é caracterizado a partir das curvas de carga dos usuários. Para cada trecho verifica-se o horário de demanda máxima e calcula-se a participação de cada usuário nessa demanda máxima e, a partir daí, atribui-se a cada usuário a parcela que lhe cabe do custo específico de cada trecho. Na metodologia do custo locacional horário não se trabalha com médias: todos os usuários e todos os trechos da rede são considerados discriminadamente no modelo.

O Custo Locacional Horário de Uso da Rede permitirá o cálculo distinto dos custos dos usuários atendidos pelas redes rurais e pelas redes urbanas e ainda permitirá o cálculo do Custo de Uso da Rede pelos geradores. Destaca-se que, no caso da TUSDg, recomenda-se de forma contundente a aplicação de sinal locacional para direcionar essas unidades para os centros de carga.

Além de dar sinal horário adequado – aderente aos custos, dando maior liberdade para definição das modalidades tarifárias, devem-se eliminar as perdas de receita das distribuidoras, alterando a forma de considerar o mercado realizado no processo de construção da TUSD e implantando o decoupling, ou seja, desvinculando a receita utilizada na construção das tarifas de cada reajuste da receita realizada, de forma a protegê-la da inserção da MMGD e eliminar as barreiras para que as distribuidoras se tornem promotoras de programas de eficiência energética e atuem firmemente na otimização da rede de distribuição, na redução dos custos para a sociedade.

Por último, deve-se colocar que o modelo tarifário deve ser pensado como um todo. Entenda-se como modelo tanto as variáveis a serem faturadas quanto os custos a serem cobertos e os subsídios a serem praticados, para cada um dos diferentes usuários.

As modalidades tarifárias para cada subgrupo, para cada usuário (consumidor, gerador, prossumidor), devem ser discutidas em um mesmo processo, mantendo a coerência do conjunto. Além disso, a discussão das modalidades tarifárias deve estar necessariamente lastreada pelo estudo de viabilidade das alternativas, considerando os respectivos custos adicionais, em especial, os relativos aos equipamentos de medição. Os custos de implantação evidentemente não podem ser maiores que os benefícios esperados e, nesse aspecto, é fundamental que as análises sejam abertas por classe e faixa de consumo na baixa tensão.

Esse é o caminho da modernização das tarifas de distribuição no Brasil. Realmente é um caminho árduo, de muito estudo e trabalho, não há uma solução fácil nem simples, embora a tarifa desenhada ao usuário final deva ser de simples aplicação (isso, na verdade, torna o problema ainda mais complexo). Vai exigir que as empresas aprofundem o conhecimento da sua rede, entendendo como os diversos clientes a utilizam e como afetam os custos de sua expansão. Vai exigir uma nova regulação, menos engessada, e que o regulador tenha uma estrutura de pessoal bem maior, com tempo para analisar as diversas e distintas propostas tarifárias e para conhecer, de forma profunda, o extenso, complexo e diferenciado sistema elétrico brasileiro.

Vai ser necessário que o regulador calcule de forma mais precisa os custos dos clientes e, em futuro próximo, evolua para o cálculo do custo locacional horário. Nisso está depositada a força de toda equipe de pesquisadores e promotores deste P&D – Aperfeiçoamento da Estrutura das tarifas de Energia Elétrica no Brasil, como também toda nossa esperança.